A revolução tecnológica dos anos 90 enterrou de vez os conceitos de “dependência”, “países periféricos” e outras designações que permearam o estudo das ciências sociais por varias décadas. A justificativa para eliminar tais conceitos foi a euforia ideológica dos novos gurus da globalização, que diziam que tais idéias tinham perdido sua operacionalidade, já que careciam de fundamentos para entender a nova realidade econômica. As brutais disparidades entre países foram disfarçadas por um discurso global que tentava impor a imagem de um planeta supermoderno, ligado por redes inter-relacionadas, longe do controle público e dominado por grupos econômicos transnacionais.
A revolução da informática parecia ser o catalisador destas mudanças
O declínio dos preços e a maior eficiência nas comunicações telefônicas, criaram a ilusão de um mundo no qual a grande maioria dos seres humanos poderia, num futuro próximo, estar interconectados definitivamente. O argumento para essa possibilidade se concretizar é o barateamento das comunicações telefônicas. Em menos de sete décadas o custo das ligações entre Londres e nova York caiu de 300 para 1 em patamares reais. Todos os processos de informação acompanharam essa tendência, tendo como resultado o desenvolvimento generalizado da informatização nas sociedades do primeiro mundo e nos setores ricos da periferia.
Entretanto, se observamos os “Indicadores de Desenvolvimento Mundial” (Banco Mundial, 1998), vemos que os países considerados de alta renda, com apenas 16% da população mundial, concentram 65% das linhas telefônicas, enquanto os países de baixa renda, que contam com 56% da população mundial, possuem 11% dessas linhas. O mais atordoante é que, se excluímos a China e a Índia do conjunto dos países considerados pobres, verificamos que 1 bilhão de habitantes dispõem de somente 1,5% das linhas (11 linhas telefônicas por 1000 pessoas), enquanto os habitantes dos países mais ricos contam com 50% das linhas do mundo todo (565 linhas telefônicas por 1.000 pessoas).
As poucas linhas telefônicas existentes proporcionam um serviço extremamente caro para os habitantes dos países pobres; ao tempo que as pessoas do Primeiro Mundo gozam de comunicações sumamente econômicas. Três minutos de comunicação local nas nações de “alta renda” equivalem a menos de 0,2% do ganho diário por habitante. Em contrapartida, para os países pobres, tal ligação representa 7% da renda diária por habitante; e se excluirmos novamente a China e a Índia deste grupo, o número aumenta para 11%. Para os habitantes dos países de “alta renda”, uma chamada telefônica para os Estados unidos é 176 vezes mais barata do que um país de “baixa renda”, ou 285 vezes mais barata se excluirmos a China e a Índia.
Após quase quatro anos de privatização das telecomunicações no Brasil, problemas similares se repetem de forma dramática no país. Ainda persistem os antigos contratempos no novo modelo de prestação de serviço público essencial (telefonia fixa) agravados com a alta de preços das tarifas, que continuam de forma desenfreada. A partir do início do processo de privatização (até meados de julho de 1998), o valor da assinatura residencial cresceu mais de 2500%. Segundo o Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC), em 1996 uma assinatura custava R$0,62 centavos e atualmente custa R$26,58. Em julho de 1998, quando o sistema Telebrás foi vendido, a assinatura residencial custava R$ 13,28 subindo até atingir o patamar de 42,5%, sendo que o INPC do período teve apenas uma variação de 15%. Por outro lado, o aparecimento das inovações tecnológicas, produto de uma modernização reflexa e deformada, agravou as desigualdades regionais. As empresas dos países ricos dispõem de grandes vantagens tecnológicas que lhes permite substituir as dos países pobres, provocando com isso perdas de empregos e esvaziamento de renda. Como se isso não bastasse, as empresas de telecomunicações transnacionais, na sua voracidade ilimitada, tentam recuperar seus investimentos iniciais através de uma política de preços perversa, contrária a qualquer tipo de racionalidade econômica. O país termina pagando um preço muito alto por uma tecnologia que não acrescenta nada ao desenvolvimento autônomo da nação, e porque a difusão indiscriminada dessas novas tecnologias provoca um desmantelamento e desnacionalização da indústria nacional, no qual o povo mais pobre, como sempre, termina sendo o fiel depositário do círculo vicioso do subdesenvolvimento.
Na década de 1990 surgiu a ilusão de que haveria um processo geral de bem-estar planetário, do qual todas as pessoas seriam seus beneficiários diretos, graças à livre concorrência global. A modernização reflexa levou infinidades de pessoas a carregar celulares em seus bolsos sem saberem qual é sua verdadeira utilidade, principalmente quando são mostrados apenas como signo de “status” e não como ferramentas de trabalho.
É patético ver como nosso povo é induzido a consumir produtos caros e supérfluos, enquanto a verdadeiras necessidades do país são displicentemente esquecidas.
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