terça-feira, 25 de novembro de 2008

11 DE SETEMBRO

Nas primeiras horas da madrugada a tragédia começava a ser delineada com os tênues raios do sol. Quando os aviões em vôo rasante começaram a descarregar as bombas sobre o Palácio de la Moneda, também se iniciou a destruição de uma das democracias mais sólidas do continente, construída em cento e cinqüenta anos de evolução política e social. Nesse dia 11 de setembro de 1973, as bombas de Augusto Pinochet demoliram de vez toda uma tradição de valores históricos fundados no estado de direito e no respeito às leis. O assassinato do presidente Salvador Allende aconteceu a partir de um plano cuidadosamente elaborado, e não apenas como resultado do simples ódio da burguesia chilena, apavorada com a possível perda de seus privilégios. A história desse desenlace trágico começa nos primeiros meses da administração da Unidade Popular. O triunfo de Allende levou ao serviço de inteligência e ao Departamento de Estado americano, segundo denúncias do New York Times, a enviar a Santiago o diretor-adjunto da CIA, Thomas Karamossines (chefe de operações secretas), para que estudasse várias alternativas para impedir a posse do presidente eleito. De acordo com o jornal, em 15 de setembro de 1970, o presidente americano Richard Nixon realizou uma reunião com a participação do chefe da CIA, Richard Helms, na qual criticou sua incapacidade em impedir que Allende assumisse a presidência do Chile. Entretanto, o fracasso da tentativa, deveu-se não apenas aos serviços de inteligência, senão também as sugestões erradas do plano elaborado pela International Telephone and Telegraph (ITT), que previa atos de sabotagem à produção, restrição de créditos externos e colapso econômico imediato. A triste passagem da ITT no Chile é suficientemente conhecida quanto ao financiamento da greve dos caminhoneiros, que foi o ponto de partida para o golpe militar de 1973. O próprio New York Times colheu as denúncias dos repórteres e congressistas, assim como o reconhecimento explícito do então presidente americano Gerald Ford sobre a intervenção de seu país no Chile, como forma de proteger “os grandes interesses americanos na região”.
Poucas vezes na história do continente latino-americano aconteceu um ato de terrorismo internacional expressado de forma tão brutal. Tão escandaloso, que em fevereiro de 1975, formou-se um comitê no senado americano, presidido pelo senador Frank Church, com o objetivo de investigar as “operações secretas” dos serviços de inteligência americanos no Chile. A política de intervenção americana, arrogante e intimidatória, repete-se com George Bush, não apenas no Afeganistão ou no Iraque arrasado, senão também nas suas palavras recentes dirigidas ao presidente argentino, quanto sua preocupação ao surgimento do que ele considera um governo de esquerda no país vizinho. Começam a surgir sinais de fenômenos sociais que imitam o passado recente de forma burlesca. Estamos entrando numa nova era no qual o conceito de “guerra fria” tal vez tenha perdido sua capacidade de explicar os novos paradigmas geopolíticos. Entretanto, não devemos esquecer que a invocação hipócrita “da lei, da democracia e da liberdade” pode estar criando um substituto daquela expressão, que num processo com franca característica neo-imperialista, pode-nos levar a formas de barbárie sem precedentes na história.

Victor Alberto Danich
Sociólogo