quinta-feira, 3 de julho de 2008

SECUESTRADO POR UM OVNI

O OVNI do Bairro Três Rios do Norte esteve por lá para despistar as pessoas. Na verdade, outro mais discreto, num ato maquinal, me abduziu enquanto estava dormindo. Acordei rodeado de homenzinhos verdes que me diziam que era um animal premiado, já que me escolheram para fazer alguns testes biológicos. Puxa vida, só faltava essa. Durante o percurso interestelar à velocidade da luz, fui me acalmando. Ao final, poderia considerar-me um cara de sorte. Conferir corporalmente a Teoria da Relatividade é um privilégio que ninguém teve até agora, se continuasse vivo para contar.
De tanto esperar que falassem comigo, parti para o combate verbal – a melhor arma é o ataque, pensei – Que vocês acham que são? Os donos do universo? Vocês pensam que podem tirar da cama as pessoas desse modo, sem avisar? Aquele que parecia mais velho falou no idioma de origem e depois traduziu para mim: Se não calar a boca, te acerto.
Caramba, o sujeito acabou com meus argumentos de forma conclusiva.
Sempre imaginei que os alienígenas eram mais condescendentes com os Homo Sapiens. Terminei descobrindo que há atitudes que são comuns a todos os seres, independente de sistemas ou galáxias. Parece que existe um inconsciente coletivo universal. A prova disso foi quando apareceu uma fêmea planetária. Se não fosse pela cor verde, diria que era a Gisele Bündchen. A bela se aproximou e falou sem hesitação: Não serve!
Isso acabou com minha fantasia erótica de ser seduzido por uma extraterrestre. Em fim, minhas alternativas, a essa altura (e a essa distância) eram tremendamente escassas. Fiquei quieto tentando consertar meu ego destroçado. Com o tempo pude verificar que nossos amigos são gente boa. Como eles desistiram de me entregar para a madame, nossa conversa fluiu descontraída.
Um deles fez questão de me apresentar os filhos. De longe, é claro. E me explicou as razões, que tentarei detalhar sem perder a auto-estima. Parece que no universo infinito não existe muito divertimento. O único lugar para visitar e dar risada de coisas inexplicáveis é a Terra. Somos o Zoológico das Galáxias. Às vezes, nossos visitantes se escandalizam, outras se compadecem, mas nunca se aproximam. Tal constatação me levou a pensar no meu destino incerto. Por que comigo, então? Tremendo engano. A gostosa estava escolhendo um bichinho de estimação, e desistiu vencida pelo risco. Isso podia significar o retorno a meu habitat. E foi o que aconteceu.
Aquele que parecia mais velho começou a discursar no idioma deles. Depois de algum tempo, voltou-se para mim e emitiu uma sentença categórica: Vamos te levar de volta.
Que alegria! Retorno ao Zoológico. Pode ser um planeta de loucos, mas é meu planeta. Nele ainda tenho a liberdade de escolha. Posso ser bom ou mau. Posso ser solidário ou insensível. Posso me irritar com as injustiças e lutar para acabar com elas. Ganho com isso o direito de renunciar a ser cobaia de outros mundos, tornando-me mais humano para sempre.
Victor Alberto Danich
Sociólogo

AS INCERTEZAS DA VIDA

Sempre me ensinaram, desde criança, que deveria respeitar os mais velhos. Agora que sou velho tenho que respeitar, por convencimento, os mais jovens. Tal comentário não é um jogo de palavras. É uma frase que faz com que sempre esteja policiando nossas máscaras, de modo a preservar a dignidade da pessoa, na liberdade. Na medida em que o tempo vai passando, ele vai se modelando de diversas formas (até circular, como diria o escritor Borges) e nos faz pensar que essa história de “pobres velinhos” é uma mentira disfarçada. A construção cultural de que a senilidade torna as pessoas frágeis e desconcertadas, é uma farsa secular. Se a gente foi ruim de jovem, podem ter certeza, com a velhice isso vai aumentando proporcionalmente. O esconde-esconde das ações e dos maus pensamentos sempre vem acompanhado da fachada de “pobrezinho o vovozinho”.
Claro! Não se espantem. Nada nesta vida é uma constante linear. Não existe bem de um lado e mal do outro. Tal maniqueísmo é próprio das invenções politicamente corretas, aceitas como verdadeiras. Isso acalma a sociedade. Se houver uma recaída senil, é apenas um desvio. As monstruosidades cometidas por velhos são dissimuladas nos porões do esquecimento social.
Mas vejam, as estatísticas mostram que por cada jovem mal encarado, existe um velho muito pior. A história da humanidade nos revela isso. Insanos enrugados, tarados senis, destruidores insensíveis, assassinos cruéis, seqüestradores infames, escritores malfadados, militares diabólicos, políticos corruptos, estupradores de crianças, religiosos pedófilos, expertos que se fazem passar por loucos e muitos outros. A lista é interminável. Os jovens devem viver apavorados. Sinto uma profunda compaixão por eles.
Nessa trágica enumeração, o que há de similaridade? Todos são velhos, não tem muito tempo de vida. Anelam a juventude que perderam. Vingam-se destruindo o mundo e sua beleza. Não suportam a exuberância juvenil, desautorizando-a com a artimanha de que a experiência é resultado dos anos. É por isso que nós, velhos, devemos aprender com os jovens. Eles, todos os dias, nos ensinam alguma coisa nova. O amor juvenil, o desapego às convenções, os sonhos ilimitados e as vivências da própria vida. Não temos direito de isentar-nos da contemporaneidade de nossos atos. Devemos sim, responder por eles do que nos desonerar da responsabilidade sobre os mesmos. Nossa tarefa é descobrir nesse percurso quais são os erros cometidos. Quem sabe um dia a gente possa compartilhar a vida sem as incertezas da longevidade, com os velhos refazendo os caminhos para que os jovens os transitem sem medo do futuro.
Victor Alberto Danich