segunda-feira, 26 de abril de 2010

O GIGANTE ADORMECIDO

O mito do reinado absoluto do mercado através da globalização irreversível, trouxe com ela a chave de sua própria destruição. Uma das maiores forças potenciais que definiram a descoberta de que uma outra realidade possível, além da eterna divisão internacional do trabalho, levou o mundo a novas formas de pensamento econômico. O “gigante adormecido”, conhecido como o mundo em desenvolvimento, está acordando do longo torpor a que foi submetido. Aqueles que por tanto tempo aceitaram o papel da privação, da inferioridade, da subserviência, estão dizendo basta. Depois de terem aceitado a miséria e a fome como imposições do destino, os países em desenvolvimento estão enxergando cada vez mais que as características deste sistema global são inaceitáveis, e mais ainda, que pode e deve ser mudado. Quais são os entraves ideológicos para operar tal mudança?
A história do mundo subdesenvolvido constituiu um conjunto de experiências homogêneas, tentativas fracassadas de desenvolvimento, dependências antigas e recentes, onde as desigualdades sociais se manifestavam em círculos modernos de alto consumo e amplos setores submersos na exclusão social. Os sonhos progressistas das décadas de 60 e 70, que se apresentavam como a esperança de um mundo mais justo, foi substituída por uma visão de origem monetarista, no qual, tais sonhos, apareciam como um pesadelo, um universo horroroso e sem saída, transbordando em corrupção e miséria. A imagem de um Terceiro Mundo revolucionário, exportador de saúde moral e humanismo foram transformados num subúrbio desordenado e caótico, reprodutor de uma incapacidade crônica. A imprensa conservadora e seus seguidores costumavam abusar desse tipo de imagem, apresentando seqüências de sociedades vistas como ineficazes, indolentes e irracionais. Divulgando notícias confusas sobre hordas de talibanes e guerreiros do Congo espalhando o caos e o terror, populações famintas, catástrofes ecológicas, governantes corruptos, massas ignorantes infestadas de patifes e indolentes. A solução do problema era realizada através de “experiências exemplares” de desenvolvimento. De que maneira?
Nada melhor do que a entrada de investimentos estrangeiros, monitoramento do Banco Mundial e cópias quase perfeitas das técnicas ocidentais de gestão. Nessa configuração econômica, alguns países confiáveis foram contemplados, e outros, ao não desfrutar de “boas qualificações” passaram a ser criminalizados por sua “má conduta”, enquanto suas populações continuaram sofrendo as seqüelas do subdesenvolvimento. Tudo isso serviu para justificar a reprodução de uma velha ilusão do século XIX, que expressava o progresso indefinido e eterno do liberalismo econômico. O que quer que aconteça, além das tragédias e fracassos diários, diziam-nos os ideólogos neoliberais, o mundo se encaminha para o capitalismo integral, próspero, cheio de oportunidades para todos. Se os intelectuais ideologicamente independentes, cidadãos desse “gigante adormecido”, tentam demonstrar que a realidade parece desmentir tal crença, lá estão os gurus para explicar-lhes que suas leituras são falsas, demasiado apegadas às misérias cotidianas, e que ofuscam a visão de um futuro brilhante. Na superação desse “pacote ideológico” neoliberal, os líderes políticos e culturais dos países em desenvolvimento compreendem que para eles o melhor, em termos de realizações sociais, não consiste necessariamente em abandonar sua próprias raízes culturais, em favor de uma cultura estrangeira procedente das sociedades desenvolvidas do ocidente. Existe entre eles, como é o caso do Brasil e seus parceiros, uma insistência cada vez maior na adoção não só de uma nova ordem econômica internacional, mas também a utilização de caminhos alternativos de desenvolvimento. Tal iniciativa passa por um conjunto de necessidades humanas universais, que implica o tema da inclusão social como direito fundamental, tão profunda em suas implicações quanto o foi o conceito de democracia, dois séculos atrás.
Victor alberto Danich
Sociólogo