quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

A TRISTE HISTÓRIA DA VENEZUELA

Na Venezuela dos anos vinte, o poço de “La Rosa” lançava à superfície cem mil barris por dia. Ao mesmo tempo, o ouro negro coexistia no meio de imensos latifúndios, guardados zelosamente por fazendeiros que, a qualquer desvio, castigavam seus peões enterrando-os vivos até a cintura. A magnificência do lago de Maracaibo escondia nas suas entranhas um tesouro que só traria miséria e desgraça a muitas comunidades indígenas e de agricultores que, despojados de suas terras, foram compulsoriamente submetidos à lei do petróleo de 1922, redigida descaradamente por três empresas americanas. As concessões à Shell, Standard Oil e Gulf permitia cercar os campos petrolíferos com arame farpado e dispor de uma polícia própria. Não havia permissão sequer para transitar pelas estradas que escoavam o petróleo aos portos. Segundo a revista Time de 11 de setembro de 1953, citada por Eduardo Galeano nas “Veias Abertas da América Latina”, um negociante de petróleo americano declarava cinicamente em Caracas “Aqui, as pessoas têm a liberdade de fazer com o dinheiro o que quiserem; para mim, esta liberdade vale mais do que todas as liberdades políticas e civis juntas”. É claro, sempre que isso seja em benefício das minorias privilegiadas. Na década de 60, a Venezuela era um barril de petróleo no qual flutuavam “os automóveis e as geladeiras, o leite condensado, os ovos e as alfaces” importados dos Estados Unidos. Também, no subsolo ignorado, os “cárceres e as câmaras de torturas” instaladas por decreto. A vertiginosa construção de um país de produtos enlatados, dependente da modernização reflexa, no qual uma classe média de salários inimagináveis, que mora nos grandes centros urbanos, e não consegue frear a “ansiedade de gastar, consumir, obter, usar, apoderar-se de tudo”, enquanto nas “ladeiras dos morros, mais de meio milhão de desvalidos contempla, de suas choças armadas de lixo, o desperdício alheio”, se escandaliza perante os discursos que podem colocar em risco sua fartura novelesca. Quando se fala de democracia, devemos estar atentos aos significados históricos do termo, para não confundir-la com outras acepções. No plebiscito do domingo na Venezuela houve entre o Sim e o Não uma pequena diferença. Isso mostra duas coisas. Por um lado, a existência de desigualdades desoladoras e antagônicas entre as classes sociais e, por outra, a legitimidade do Poder Eleitoral, sempre questionado pelos setores de oposição ao governo, que ganha, neste caso, a suficiente credibilidade para demonstrar a capacidade de tomar suas próprias decisões.

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