sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

MENSAGEM DE UM ATEU AOS CRISTÃOS

Não aceitar a existência de divindades, não significa que o conhecimento religioso seja excluído do imaginário intelectual daqueles que não acreditam. Ao contrário, conhecer fatos relacionados à história das religiões, resulta muito importante para entender como funcionam tais mecanismos culturais. Para ser ateu é necessário “a priori”, ter sido religioso. O caminho da experiência metodológica leva-nos a observar a construção da realidade através de infinitas visões. O ateísmo é uma delas. Não entanto, por ter sido católico na minha adolescência, acho que devo, por compromisso, fazer algumas considerações com referência aos festejos natalinos que se aproximam.
A teologia protestante, que surge com a Reforma, é um exemplo claro da filosofia do individualismo implantada pela burguesia nascente, que precisava da suficiente liberdade para abrir espaço a produção e o comércio, como também em relação à condenação moral que a Igreja Católica associava a tais atividades. A doutrina da justificação pela fé, foi à precursora inconsciente das novas práticas econômicas da burguesia. Dessa forma, os puritanos tentaram espiritualizar os processos econômicos, impondo, de certa maneira, a idéia de que "Deus tinha criado o mercado e a troca", sempre considerando o valor religioso baseado no trabalho árduo e ascético como forma de se glorificar a Ele. Não e de estranhar, portanto, que a figura simpática de Papai Noel, que faz parte das tradições pagãs dos Celtas e dos países nórdicos, tenha se incorporado, num processo de sincretismo religioso, ao protestantismo do norte da Europa com o nome de Santa Klaus ou São Nicolau, e que representa, sem dúvida, apesar de sua imagem inocente, a opulência e o hedonismo da sociedade capitalista. Por outro lado, principalmente os católicos, não devem esquecer que “Deus desceu até o esterco da gruta de Belém", e, portanto, o espírito do Natal deve ser configurado exclusivamente em torno da imagem do “Presépio”, com Jesus menino, com Maria, com José, com os três Reis Magos que tributam sua riqueza a pobreza.
Parece significativo o fato de o menino Jesus ter nascido pobre, que representa: "Viver a experiência dos sem teto, da periferia, da exclusão". Mais ainda, “viver e morrer de consumição, obcecado por sua virtude, sem cuidar de si mesmo, entregando sua vida em holocausto aos demais”. O Natal que prenuncia o advento de Jesus, tanto para crentes como para ateus, propicia simbolicamente o momento para repensar o sentido de sua missão como projeto solidário, na qual os pobres são as figuras principais, e com os quais os mais privilegiados devem aprender a compartilhar, ajudando-os a viver com dignidade.
Victor Alberto Danich
Sociólogo

O PAÍS DO BOLSA FAMÍLIA

Estamos nas vésperas do final de ano e, como brasileiro que sonha com a construção de um país mais justo e solidário, quero fazer algumas considerações sobre as políticas públicas de distribuição de renda realizadas pelo Governo Federal. O estudo desenvolvido pelo Centro Internacional de Pobreza em parceria com o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas – IPEA, através do texto intitulado “Todas as transferências de renda diminuem a desigualdade?”, que analisou os programas Bolsa Família, Chile Solidário e Oportunidades, implantados no Brasil, no Chile e no México, respectivamente, concluiu que o aumento do benefício ou o número de atendidos por programas de transferência, como o Bolsa Família, ajuda a derrubar a desigualdade de renda, desde que o foco permaneça na população mais pobre. Resulta interessante verificar que, nos casos brasileiro e mexicano, os repasses representam cerca de 0,5% da renda familiar total do país; e no Chile, equivale a 0,01%.
A queda na desigualdade registrada no Brasil, de quase três pontos é igual ou maior ao ritmo registrado em países como Inglaterra e França, quando aqueles países estavam instalando políticas de proteção social num passado recente. O problema que surge na aplicação de tais iniciativas, não é resultado da própria execução, senão de pessoas que, na sua insensibilidade, estão em contra de qualquer ação distributiva que não coincida com suas visões particulares da realidade econômica, sempre procurando exaltar as distorções que possam acontecer na aplicação de tais programas.
Resulta mais triste verificar que as camadas de classe média com aspirações burguesas aceitam tais críticas como verdadeiras, sem tomar a precaução de pesquisar os dados divulgados internacionalmente, por meio de instituições altamente reconhecidas. Chegará o dia em que aqueles que “nunca tem sede porque nadam em água doce” aprendam a processar as informações convenientemente, de modo a avaliar os avanços que o país está logrando através da aplicação de políticas públicas direcionadas a atender os setores excluídos da sociedade. O desenvolvimento do Brasil não se mede a partir dos celulares e os carros zero que algumas pessoas podem comprar. A medição é feita nos recursos destinados a diminuir as desigualdades sociais em todas as camadas da sociedade. Nestes últimos anos, 100 milhões de brasileiros entraram no patamar de classe média, o que significa maior consumo e maior produção de riqueza. Na Idade Média, era dever de cristão compensar aqueles que nada possuíam. Parece que os cristãos contemporâneos só ajudam quando chamados institucionalmente. O resto do discurso fica na retórica do politicamente correto, e nada mais.
Victor Alberto Danich
Sociólogo

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

A NEUROSE DO DESTINO

Nascido numa geração de pós-guerra, influenciado pela retórica cultural dos países aliados, vendo filmes de propaganda americanos ao compasso de “Chattanooga choo-choo” e “St. Louis March” com a orquestra do magnífico Glenn Miller, minha juventude sofreu o impacto perturbador das “guerras justas”. As cenas idílicas no meio das batalhas entre Humphrey Bogart e Ingrid Bergman em “Casablanca” me deixavam extasiado. Minha paixão pelos americanos não tinha limites. Era louco de desejo pela Marilyn Monroe e tinha uma brutal admiração pelo presidente Kennedy. A morte de ambos foi um divisor na minha consciência.
Descobri que o elemento de verdade por trás de tudo isso, que a maioria das pessoas está sempre disposta a repudiar, é que os seres humanos não são criaturas gentis que desejam ser amadas e que podem apenas defender-se se forem atacadas. Pelo contrário, são criaturas com poderosa quota de agressividade. Ou como diria Sigmund Freud: “O seu próximo é, para eles, não apenas um ajudante potencial ou um objeto sexual, mas também alguém que tenta satisfazer sua agressividade, explorar sua capacidade de trabalho sem compensação, utilizá-lo sexualmente sem o seu consentimento, apoderar-se de seus bens, humilhá-lo, causar-lhe sofrimento, torturá-lo e matá-lo”.
Estados Unidos é um país poderoso, sofre crises e suas falhas nos atingem, sua política externa imperial nos afeta e somos incapazes de libertar-nos. Sua agressividade tem as mesmas características das nossas. No entanto, as dimensões das tragédias sempre, na história da humanidade, mantiveram sua proporcionalidade conforme o tamanho e a importância dos países. O ser humano tenta esconder sua agressividade gratuita, sejam norte-americanos ou não, através de concepções religiosas fundamentalistas, tanto no Ocidente como no Oriente, mas que no fundo esconde a “pulsão da morte”. “A finalidade de toda a vida é a própria morte” definia Freud, que confirma que a agressão corre solta no mundo, alimentada por um impulso primitivo nessa direção. De Afeganistão ao Iraque, a tortura tem sido o sócio silencioso da cruzada pela liberdade do mercado global. A morte prematura do ser humano perante a chama do capitalismo em estado puro, é mostrada como o ponto final da evolução ideológica da humanidade.
A “neurose do destino” torna-se assim, numa compulsão a repetir uma experiência dolorosa, que se instala de maneira inconsciente nas fantasias de um povo, a ponto de se empenhar ao máximo em se deter em infelicidades e afrontas, tentando de forma neurótica dar formas realistas a esses sentimentos. O que até então era uma ficção cinematográfica do combate entre Eros e Tânatos, termina configurando-se numa destrutiva e demoníaca realidade.
Victor Alberto Danich
Sociólogo

CRÔNICA DE ALERTA

Esta crônica está focada naqueles que não conseguem dormir perante a previsão de crises mirabolantes. Desse modo, tentarei usar a temática política para desmentir a opinião dos chamados “especialistas de risco”, que são indivíduos comprometidos com a especulação financeira global, e que ganham dinheiro assustando as pessoas com presságios de um futuro incerto. Nesse caso, como tenho pouco espaço para argumentar tecnicamente, tentarei enunciar alguns itens para o leitor se acalmar. Quem sabe não seja essa uma forma exitosa de desqualificar os gurus neoliberais:
1. Acredite na medida provisória do nosso governo para socorrer aos bancos, além da ampliação do crédito para o fortalecimento do agronegócio, da produção de ferro e do petróleo.
2. Não compre dólares, confie no seu país. Os especuladores usam essa moeda para provocar o “efeito manada”. Lembre-se que o governo tem dólares sobrando. Podemos até enrolar charutos ou usá-los como papel higiênico.
3. Não acredite no Fundo Monetário Internacional. Ele está de novo ao ataque. Quer emprestar dinheiro aos emergentes para continuar mantendo sua tropa palpiteira. Inventou o termo “procedimento de emergência” para tirar dinheiro dos pobres.
4. Não se deixe enganar com desvios de atenção. Os gurus fracassados usam o método freudiano da “transferência” para culpar os outros de seus desacertos. Tentam aterrorizá-lo com os demônios Fidel, Chávez, Correa, Morales, Kirchner e ...Lula!!! Não se espante, também nosso presidente é colocado no rol dos lucíferes.
5. Não precisa estudá-los, mas lembre-se destes nomes. São os pensadores que previram as crises cíclicas do capitalismo e sua exuberância irracional: Marx, Engels, Veblen, Keynes, Lênin, Luxemburgo, Trotski, Guevara, Stiglitz, Furtado e Prebich, além do mais recente prêmio Nobel de Economia: Paul Krugman.
6. Sugiro esquecer estes outros, nos quais há pensadores, políticos e patifes: Samuelson, Friedman, McNamara, Kissinger, Thatcher, Reagan, Menem, Pinochet, Strossner, Rice, Cheney, e outro inominável.
7. Lembrem-se, se forem viajar ao exterior, os nomes dos bancos seguintes: Merrill Lynch, Lehman Brothers, Washington Mutual, Fannie Mae, Freddie Mac, Morgan. Não façam negócios com eles. Estão infestados de “ladrões de colarinho branco”.
8. Se forem aos Estados Unidos, e não quiserem que aconteça qualquer coisa de ruim com vocês, não pronunciem o nome do presidente de lá corretamente. Só de pensar, traz má sorte.
9. Por último, e para não parecerem mandamentos bíblicos, finalizo no item nove com esta alegoria: “O mercado absoluto, sem a intervenção do Estado, se assemelha a um prostíbulo global”. Você confiaria em alguém que faz sexo por dinheiro?
Victor Alberto Danich
Sociólogo