sexta-feira, 27 de agosto de 2010

THE ECONOMIST

A edição semanal da revista britânica "The Economist" publicou uma reportagem muito interessante sobre o programa Bolsa-Família. A minha atenção no texto foi redobrada pelo fato de saber que a revista é de tendência conservadora, e poderia estar veiculando o tema de forma parcial, característica habitual das nossas publicações mediáticas. Realmente, fiquei impressionado como a matéria foi conduzida. Com o sugestivo título de “Happy Families”, a reportagem cita que os governos do mundo inteiro estão olhando para o programa, afirmando, nesse sentido, que iniciativas semelhantes estão sendo testadas em larga escala em outros países da América Latina, além de destacar a adoção de um modelo baseado no Bolsa Família pela cidade de Nova York, no mesmíssimo Estados Unidos. A reportagem também discute alguns problemas do programa, como por exemplo, algumas deficiências no âmbito urbano, no sentido de resolver percalços sistêmicos relacionados à exclusão social. No entanto, em contrapartida, é realizado um franco elogio ao projeto, dizendo que o Bolsa-Familia “contribuiu para o aumento na taxa de crescimento econômico do Nordeste acima da media nacional” e ajuda, ao mesmo tempo, a “reduzir a desigualdade de renda no Brasil”.
Por outro lado, a revista destaca alguns dados importantes como resultado do programa, entre eles o aumento da presença escolar em Alagoas, em que a metade das famílias sobrevive com o acesso ao Bolsa Família, afirmando que essa iniciativa ajuda ao “programa a atingir o objetivo de romper com a cultura de dependência ao garantir uma educação melhor para as crianças". Seguindo essa linha de raciocínio, a revista destaca que, além da educação, o programa do governo brasileiro também aumentou o poder de compra dos setores mais pobres da sociedade. Um dos mecanismos para efetivar a participação desses grupos esta assentada na oferta de microcréditos, que permitiu, conforme a história contada pela reportagem a título de exemplificação, de duas famílias alagoanas que conseguiram abrir um negócio próprio, por meio de um financiamento oferecido pelo programa, aumentando desse modo a produção de suas microempresas. No entanto, a imprensa brasileira de grande circulação destaca apenas as supostas deficiências que o programa enfrenta, usando para isso algumas das considerações do “The Economist” para reforçar suas argumentações. O primeiro, entre eles, está vinculado a suspeita de fraude nas informações obtidas pelos governos locais no sentido de determinar quem tem direito de receber o benefício, assim como a verificação correta da freqüência escolar vinculado ao mesmo. Outro problema citado é que o Bolsa Família se torne um programa permanente e não “apenas um impulso temporário de oportunidade para os mais pobres”. Mesmo assim, a reportagem conclui com uma assertiva interessante, não divulgada pela imprensa brasileira, que é a acusação injusta de que o programa está destinado a garantir votos nas eleições. Por tudo isso, é importante que os grupos em melhor situação econômica, que tem acesso ao consumo social, além da possibilidade de dispor de uma educação ampla e irrestrita, deveriam tornar-se multiplicadores, se realmente gostam de serem brasileiros, de divulgar e apoiar toda política pública que resgate a cidadania dos menos favorecidos. Nesse caso, o conceito de cidadania é a condição fundamental para o ponto de partida de novas formas de desenvolvimento. O bolsa Família cumpre tal função educadora, apesar dos problemas sazonais, que é a de ensinar que a distribuição de renda pode ser possível sem a submissão às leis do mercado. Fala-se muito de ética nos discursos enlatados, porém muito pouco sobre a transformação dos valores sociais e políticos, que permitam sonhar com a mudança e transformação dos valores econômicos. Talvez seja esse o problema que nos cega, a incapacidade de descobrir que, além dos posicionamentos políticos, o ser humano está acima de qualquer desejo partidário na construção de um país melhor.
Victor Alberto Danich
Sociólogo

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