Na virada do século vinte, os Estados Unidos estavam prestes a se tornar a maior economia do mundo. Possuindo um mercado tão importante como o britânico, mas represado nas suas forças produtivas, bastou apenas um espetacular avanço tecnológico para que os custos de produção se tornassem cada vez mais baratos e, com isso, houvesse o repentino surgimento das “Câmaras de Comércio”, instituições destinadas a influenciar os preços do mercado. O interesse não revelado destas organizações era estabelecer acordos entre as empresas, de modo a limitar a produção e manter níveis de preço, obtendo assim lucros exorbitantes a custa dos consumidores. Apesar da declaração de ilegalidade por meio de leis antitrustes, as maiores companhias norteamericanas começaram a vender por preços inferiores aos dos seus concorrentes menores para depois, num golpe de misericórdia, assumir o controle. Os grandes conglomerados que surgiram destas operações, geravam lucros tão formidáveis que podiam exercer um controle absoluto do mercado sem interferências. Uma riqueza ilimitada começava a surgir nos Estados Unidos, criando gigantes econômicos que modelavam as bases para o domínio do mundo através de uma elite social diminuta e astuta. O dinheiro nas mãos desses indivíduos não podia parar. O século vinte surgia sob o comando de uma nova classe de empreendedores predadores, que assumira o controle da sociedade, que desafiava o próprio governo e se reproduzia sem dificuldades na “terra dos livres”. Thorstein Veblen, um filósofo norteamericano de origem norueguês, que ocupava um cargo docente na Universidade de Chicago, em 1892 – conhecido por seus colegas como uma pessoa excêntrica e sarcástica – foi, curiosamente, um dos maiores críticos da economia liberal que vigorava na época. Ele concluiu que os modelos matemáticos que se baseavam no comportamento racional, propostos pelos teóricos neoclássicos, tinham pouco a ver com os processos econômicos que moldavam a sociedade. As influências das forças históricas e psicológicas eram muito mais importantes na conformação da sociedade capitalista do que apenas o comportamento maximizador e egoísta. Tal pensamento foi condensado no livro “A teoria da classe ociosa”, publicado em 1899. O prólogo começa com a seguinte frase: “A instituição de uma classe do ócio é encontrada em seu melhor desenvolvimento nos estágios mais elevados da cultura bárbara”. Tal conjectura estava baseada nas atividades econômicas exibidas pela sociedade norteamericana opulenta da época. Os ricos estavam convencidos que eram diferentes dos demais. As riquezas que ostentavam, não eram simplesmente um “acidente da existência, e sim um reflexo de sua superioridade biológica”. A classe a qual pertenciam estavam livres de atividades servis. “Enquanto outras formas de vida inferiores trabalhavam, eles viviam sem esforço, nada fazendo”. Nesse caso, o ócio era sua definição qualitativa, que deveria ser exposto como forma de poder e superioridade. Não apenas como um fator de diferenciação, senão que esta qualidade devia ser demonstrada através “da viva e infatigável capacidade de pagar”. Veblen explicava magistralmente este comportamento na análise dos setores mais privilegiados da sociedade: “Todo sentido de gastar dinheiro estava em impressionar os outros” – e acrescentava – “ Despertar a inveja dos vizinhos só aumenta a sensação de importância que se tinha”. A classe ociosa não gastava dinheiro de forma ostentatória em coisas úteis – isso era para os que precisavam de dinheiro, não para os que estavam acima dele. O estudo da relação íntima entre um modelo econômico e o comportamento social dos seus executores, possibilita enquadrar as manifestações ideológicas destes na manutenção e perpetuação do sistema. O filósofo e matemático Paul Strathern faz uma análise divertida do livro de Veblen, ao dizer que este escrevera o equivalente socioeconômico de “A roupa nova do imperador” de Christian Andersen. “Descobrira-se que os ricos não vestiam nada senão seus próprios delírios de grandeza”.
Victor Alberto Danich
Sociólogo
Muito bacana o texto. Parabéns!
ResponderExcluirEsse texto é tão realista quanto perturbador, tudo é banalizado em nome do consumo, e que quase sempre para ter algo que a mídia perniciosa prolifera entregam até a alma.
ResponderExcluirOs ricos são pessoas deploráveis.
ResponderExcluirDeplorável é a sua frase. O problema não está em ser rico, mas em ser avarento. Creio a diversão dos ricos possibilitem muito mais empregos ( garçons, mecânicos, marinheiros, governantas etc) do que você, seu salário e sua mentalidade de pobre.
ExcluirNuma visão maniqueísta e/ou unilateral, imponderada e ideológica de orientação marxista é às conclusões, acima, a que se pode chegar. Porém, Veblen não objetivou reforçar positivamente o marxismo. Embora ele não tenha sido um "amante" do capitalismo, ele não era marxista, graças a Deus! Advogando pró-minhas, Bertrand Russell diz em "Elogio ao Ócio", obra posterior à de Veblen: "Uma Classe Ociosa sempre existiu... Se não fosse ela não teríamos emergido da BARBÁRIE... E foi ela que legou Shakespeare, a civilização e a ciência... enquanto nenhum estivador de Londres, da mesma época do dramaturgo é lembrado... " Injusto não!? Quantos estivadores da época de Marx são lembrados? Pois é! A diferença da Classe Ociosa atual para aquela dos antepassados é que a de outrora provinha da DISTINÇÃO NOBILIÁRQUICA ARISTOCRÁTICA enquanto a de hoje vem do MÉRITO CAPITALISTA. Simples! Para Veblen quando a Classe Ociosa veio a existir? Investiguem melhor?
ResponderExcluirVeblen não é para qualquer um apressadinhos. É preciso ter cuidado. Não é à toa que ele é uma das bases para o crescimento consistente do SETOR DE TURISMO E LAZER, ao redor do mundo, e de estudos consistentes - incluindo no Brasil - em torno desse tema moderníssimo.
Advogando pró-minhas PALAVRAS, invoco, Bertrand Russell dizendo em "Elogio ao Ócio", obra posterior à de Veblen: "Uma Classe Ociosa sempre existiu... Se não fosse ela não teríamos emergido da BARBÁRIE... E foi ela que legou Shakespeare, a civilização e a ciência... enquanto nenhum estivador de Londres, da mesma época do dramaturgo é lembrado... "
ResponderExcluirFinalmente, Veblen não é para apressadinhos!
ResponderExcluirAh... eu não sou rico (do ponto de vista da MEGALOMANIA, incisiva, acima). Mas o mundo capitalista é uma riqueza que está no ar. É só inspirar-se!
ResponderExcluirNo passado só os Aristocratas era ricos. No Mundo Capitalista qualquer um pode sê-lo (rico de conhecimento, por exemplo, e viver disso como Classe Ociosa) e, em particular, pra ser rico de dinheiro, basta viver comedidamente gastando menos do que ganha e INVESTINDO O SUPERÁVIT (apesar do Estado/Governo), não só em BENS DE USO, mas em BENS DE RENDA. Também, por esta via, se pode chegar à Classe Ociosa.
Pronto!
Quem quiser discutir... VAMOS LÁ?
FRANCISCO
f_l_gomes@hotmail.com