Vamos imaginar um maltrapilho roubando numa feira. Seguramente ele é aprisionado de maneira rápida e eficiente. A prisão é apenas um procedimento socialmente aceito como punição a um ato delitivo. As maiorias das pessoas apóiam de maneira entusiasta as sentenças e as condenações. Esses atos exemplares restauram a ordem e consolida a lógica da própria lei. Todos se sentem aliviados, a segurança pessoal está novamente a salvo.
Entretanto, todos sabemos que o sistema penal, na maioria das vezes, pune a base e não o topo da sociedade. Existe uma explicação para isso; os legisladores possuem uma idéia seletiva do que significa a preservação da ordem. É muito mais fácil enquadrar no código criminal aquelas pessoas que cometem delitos dentro de parâmetros específicos contemplados na lei. O flagrante visível é a principal arma. Roubar a poupança e os recursos das nações é chamado de “mercado livre” ; tirar os meios de subsistência de milhões de trabalhadores é chamado de “flexibilização” ou “racionalização”. Nada disso até hoje está enquadrado como ato criminoso a ser passível de punição.
Não existe nada de ofensivo nesta questão, imagino que muitos legisladores devem-se sentir impotentes pela falta de mecanismos legais que punam este tipo de coisas. Os atos ilegais realizados nos setores mais altos da escala social, são invisíveis como uma substância etérea, parecem existir apenas virtualmente. Nas grandes transações a escala mundial, onde imperam atividades focadas no ganho pessoal a custa dos outros, a tênue e imprecisa linha que separa os atos delituosos dos legais, em nada se assemelha ao roubo de um pedaço de frango numa feira.
Não é de estranhar que as prisões estejam cheias de indivíduos identificados como “o setor excluído da sociedade” e catalogados na ordem específica de crimes tradicionais. Os crimes realizados “no topo da escala social” dão a impressão de acontecerem sem a participação de indivíduos, como se fossem sobrenaturais, sem substância física. É tão vasta a rede de cumplicidade, de poder financeiro e procedimentos sofisticados, que estes atos criminosos ocorrem numa abstração tal, que se tornam impossíveis de serem detectados. É possível imaginar que nesse “corporativismo criminoso” a origem de grandes fortunas seja através de operações dolosas, mas demonstrá-lo significaria um risco sumamente perigoso.
Temos claros exemplos de “crimes de colarinho branco” que raramente são levados aos tribunais e ao conhecimento da opinião pública, ainda assim com a ajuda exaustiva da imprensa oral e escrita, como no caso recente do Juiz Nicolau e do Senador Luiz Estevão, ou os ex-presidentes Menem da Argentina e Fujimori do Peru, acusados por desvios do patrimônio público e formação de quadrilha. No entanto, fraudadores, estelionatários, autores de desfalques, mafiosos, grandes traficantes, e todo tipo de autores de “crimes empresariais”, possuem uma capacidade ilimitada de realizarem acordos fora dos tribunais do que qualquer delinqüente que faz parte da “base da sociedade”. O que ocorre durante os processos de julgamento dos “ladrões de alto nível” desafia a imaginação mais fértil até os limites da ciência ficção, infinitamente longe do drama cotidiano daquele simples ladrão de galinhas.
Victor Alberto Danich
Sociólogo/ Jaraguá do Sul
Entretanto, todos sabemos que o sistema penal, na maioria das vezes, pune a base e não o topo da sociedade. Existe uma explicação para isso; os legisladores possuem uma idéia seletiva do que significa a preservação da ordem. É muito mais fácil enquadrar no código criminal aquelas pessoas que cometem delitos dentro de parâmetros específicos contemplados na lei. O flagrante visível é a principal arma. Roubar a poupança e os recursos das nações é chamado de “mercado livre” ; tirar os meios de subsistência de milhões de trabalhadores é chamado de “flexibilização” ou “racionalização”. Nada disso até hoje está enquadrado como ato criminoso a ser passível de punição.
Não existe nada de ofensivo nesta questão, imagino que muitos legisladores devem-se sentir impotentes pela falta de mecanismos legais que punam este tipo de coisas. Os atos ilegais realizados nos setores mais altos da escala social, são invisíveis como uma substância etérea, parecem existir apenas virtualmente. Nas grandes transações a escala mundial, onde imperam atividades focadas no ganho pessoal a custa dos outros, a tênue e imprecisa linha que separa os atos delituosos dos legais, em nada se assemelha ao roubo de um pedaço de frango numa feira.
Não é de estranhar que as prisões estejam cheias de indivíduos identificados como “o setor excluído da sociedade” e catalogados na ordem específica de crimes tradicionais. Os crimes realizados “no topo da escala social” dão a impressão de acontecerem sem a participação de indivíduos, como se fossem sobrenaturais, sem substância física. É tão vasta a rede de cumplicidade, de poder financeiro e procedimentos sofisticados, que estes atos criminosos ocorrem numa abstração tal, que se tornam impossíveis de serem detectados. É possível imaginar que nesse “corporativismo criminoso” a origem de grandes fortunas seja através de operações dolosas, mas demonstrá-lo significaria um risco sumamente perigoso.
Temos claros exemplos de “crimes de colarinho branco” que raramente são levados aos tribunais e ao conhecimento da opinião pública, ainda assim com a ajuda exaustiva da imprensa oral e escrita, como no caso recente do Juiz Nicolau e do Senador Luiz Estevão, ou os ex-presidentes Menem da Argentina e Fujimori do Peru, acusados por desvios do patrimônio público e formação de quadrilha. No entanto, fraudadores, estelionatários, autores de desfalques, mafiosos, grandes traficantes, e todo tipo de autores de “crimes empresariais”, possuem uma capacidade ilimitada de realizarem acordos fora dos tribunais do que qualquer delinqüente que faz parte da “base da sociedade”. O que ocorre durante os processos de julgamento dos “ladrões de alto nível” desafia a imaginação mais fértil até os limites da ciência ficção, infinitamente longe do drama cotidiano daquele simples ladrão de galinhas.
Victor Alberto Danich
Sociólogo/ Jaraguá do Sul
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